[REVIEW] Arte Sonora: Queen, Lágrimas & Glória (Lisboa, Portugal – 07/06)

Queen, Lágrimas & Glória

por Nero

Em Janeiro de 1930 foi publicada pela primeira vez a “Astounding Stories Of Super-Science”. Até aos nossos dias, a publicação teve várias designações. Em Outubro de 1953 o título era “Astounding Science Fiction” e foi para a edição de Outubro desse ano que Frank Kelly Freas desenhou, como capa, um robô gigante (de olhos humanos) a segurar o corpo de um humano morto. O Queen contactou Freas, perguntando se o artista poderia alterar o desenho para a capa de “News Of The World”.

É esse robô, numa projeção 3D, que rebenta com a ilusória parede no palco da Altice Arena, embalado pela batida bélica de “Tear It Up” e pelo rasgar dos acordes de Brian May. O titã de metal detém-se sobre a banda, enquanto ouvimos de rajada a icônica “Seven Seas Of Rhye”, tema que, ao invés de suceder para a segunda parte, explode em “Tie Your Mother Down”. Aí ouvimos o primeiro solo da Red Special. O som do concerto ainda “não está lá”, mas a assinatura sonora da guitarra é inevitável e Brian May está em forma.

As emoções só são refreadas através de “Play The Game” e da sua síncope intrincada, mas o fôlego é recuperado por pouco tempo… Um improviso de guitarra com volume em crescendo faz ponte para a divertida “Fat Bottomed Girls”, essas garotas que fazem o mundo do rock ‘n’ roll girar. Quem nunca?

O som de guitarra está qualquer coisa. A parede de Vox AC30 (seis unidades) oferece aquilo que, entre outras coisas, EVH “fanou” ao Queen e a Brian May, o conceito chamado brown sound. Um crunch, como o chocolate, estaladiço e doce! A primeira homenagem direta a Freddie Mercury surge através da interpretação da quintessencial “Killer Queen”, em que Adam Lambert adota mais os maneirismos de Freddie, fazendo recordar um comentário no YouTube, sobre a sua atuação com a banda no Rock in Rio Lisboa em 2016: “O pai deixou-nos. E, embora deteste o novo padrasto, lá no fundo sei que é a melhor opção para a mãe”. Sentimentalão? Sim. Acertado? Sem dúvida!

Nunca ninguém esquecerá Freddie Mercury e cada concerto do Queen é um vibrante testemunho da imortalidade da música. Brian May, Roger Taylor e Adam Lambert ofereceram mais uma noite inesquecível a Lisboa.

Adam Lambert, no final desse tema presta ainda homenagem a Brian May e Roger Taylor, as lendas que o acompanham e admite que, com eles em palco, nunca sabe o que está a viver, fazendo o trocadilho: “Is this the real life? Is this just fantasy?” O vocalista, através de uma evidência, continua a recordar Mercury, afirmando que Freddie há só um e pedindo que Lisboa celebre o famigerado músico e as suas canções durante o concerto. Então entra “Don’t Stop Me Now” e a Altice Arena vem abaixo! Os decibéis do público, acompanhando todo o tema, ameaçam ultrapassar aqueles debitados pela banda. Um dos momentos altos da noite. Inesquecível!

“Bicycle Race”, outro momento Vaudeville, gênero a que Freddie era tão apegado, antecede a mais sinfônica “I’m In Love With My Car”, cantada por Taylor. E surge outra explosão de intensidade, com “Another One Bites The Dust”. E então chega outro dos grandes momentos da noite.

Brian May percorre o corredor do palco, que não é nada menos que uma esquematização da sua Red Special, e senta-se no “headstock”, sozinho com uma Guild F-512, uma acústica de doze cordas, para tocar “Love Of My Life”. A canção é cantada a plenos pulmões por uma Altice Arena lotada. Arrepiante. No final, sabemos que vai surgir a projeção de Freddie Mercury, com a sua voz a ouvir-se sincronizada com May, por cima da guitarra, mas é impossível não ficar com os olhos em lágrimas. Que saudades, Freddie…

Quando a banda regressa toda, em “Somebody To Love”, o som está perfeito. Houve-se nitidamente cada nuance de percussão de Tyler Warren, das sintetizações do histórico Spike Edney (que acompanha o Queen, em turnê, desde 1984) e do groove do baixo de Neil Fairclough. A loucura torna a instalar-se no público durante “Crazy Little Thing Called Love”, a guitarrada final de Brian May é sublime. Está como o vinho, o guitarrista! A partir daqui, há mais quebras dinâmicas no concerto. Como o trovejante duelo de baterias ou a improvisação de delays de Brian May. Um momento clássico nos concertos da banda, mas que terá sido demasiado longo… Pelo meio ouvem-se as duas maiores pérolas do setlist: “Under Pressure”, evocando também o sempre omnipresente espectro de Bowie; “I Want To Break Free”, mais um tema berrado por cada garganta presente no concerto; e a arrepiante “Who Wants To Live Forever”.

O longo concerto, que tem passado a correr, aproxima-se do final, com mais um bloco de hinos: “The Show Must Go On”, “Radio Ga Ga” e, claro, “Bohemian Rhapsody”. Os guitarristas presentes no concerto terão ficado a salivar com as harmonizações cristalinas de Brian May em “The Show Must Go On”. É certo que o músico usa um harmonizer de rack da Eventide há largos anos, mas o mais provável, tendo as harmonizações soado tão vivas e corretas, é ter recorrido a outro método que celebrizou, usando duas unidades de delay para criar as sobreposições.

Surge a projeção de Freddie a desafiar vocalmente o público presente no mítico concerto de Wembley, em 1986. Mais emoção, mais saudade. “We Will Rock You” e “We Are The Champions” são os últimos temas, antes de soar o triunfal arranjo de guitarras de Brian May à composição clássica “God Save The Queen”. Freas, o artista da capa de “News Of The World” era um fã de música clássica e não ouvia música rock, nem conhecia o Queen. Apenas ouviu a banda depois de terminar a capa, pois “tinha receio de odiar a sua música, o que iria arruinar o meu trabalho”, mas tornou-se fã da música do Queen. Como todos nós.

Autoria do Post: Josy Loos
Fonte: Arte Sonora

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