The Telegraph: Adam Lambert: “Freddie é um mito, como posso viver com isso?”

Confira um interessante artigo publicado pelo Jornal inglês The Telegraph, com declarações exclusivas de Adam Lambert, Brian May e Roger Taylor sobre suas experiências juntos no Queen.

Adam Lambert e Queen: “Freddie é um mito, como você vive com isso?”

A imagem e voz de Adam Lambert fazem dele um dos poucos artistas capazes de entrar no lugar de Freddie Mercury, diz Neil McCornick.

“Eu não sou Freddie” insiste o barbudo jovem americano, descansando em uma jaqueta preta e dourada, calças apertadas e botas de amarrar até o joelho. “Eu não estou tentando ser Freddie ou competir com Freddie. Mas eu sinto alguma similaridade, eu estou aproveitando essa oportunidade de fazer com que a música dele ganhe vida de novo”.

No primeiro dia de 2015 o termo mais procurado do Google no Reino Unido era “Adam Lambert”. Parece que o país inteiro tinha sido agitado por uma curiosidade coletiva sobre a identidade do cantor que deu as boas vindas ao ano novo com o Queen. Os foguetes explodiram, 12 milhões de expectadores balançavam ao som de “Bohemian Rhapsody” e “We Are The Champions” no BBC One.

Essa semana, a banda embarca para uma turnê em arenas, se apresentando para mais de 160.000 fãs por todo o continente. Isso é bem impressionante para uma banda cujo icônico vocalista, Freddie Mercury, faleceu 24 anos atrás. Então, quem é esse jovem pretensioso cantor que agita o microfone na frente do grisalho baterista de 65 anos, Roger Taylor, e dos cabelos crespos do guitarrista de 67 anos, Brian May?

“Adam é um fenômeno” disse May sobre o vocalista quando o viu pela primeira no American Idol. “Nós não estávamos procurando por outro cantor, mas ele é como um presente de Deus. Ele tem essa habilidade técnica que vai além das habilidades dos 99.9% odos utros cantores no mundo. Você vê isso e não pode deixar de pensar ‘o que aconteceria se abrirmos essa caixa novamente?’”

“Meu apelido para ele é Camp Elvis”, diz Taylor “Sua presença e carisma me lembra Presley de tantas maneiras, o olhar, a presunção, sua atitude abertamente sexual. Ele é absolutamente cintilante no palco, uma voz em um milhão, e o mesmo aconteceu com Freddie. Há algumas semelhanças assustadoras, especialmente socialmente, como um homem gay cheio de humor e ousadia. Tem momentos nos bastidores que parece que nada nunca mudou.”

“F**k yeah, eu tinha dúvidas! Foi realmente intimidante”, declarou Lambert, falando de sua primeira apresentação com a lendária banda de rock, “Freddie é como um mito, como viver com isso?”

Lambert tinha apenas nove anos quando Mercury morreu. Ele descobriu a banda através da coleção de discos do seu pai. “Todo mundo conhece alguma coisa do Queen, você os ouve em eventos esportivos nos estádios. Meu pai me ajudou a fazer a conexão entre a música e as pessoas que a faziam”. Ele já era um fã quando teve a chance de cantar “We Are The Champions” com May e Taylor durante a final do American Idol em 2009.

“Eu estava me beliscando. Esses caras fazem parte da era de ouro do rock, você vê suas fotos em livros e revistas, e então você de repente eles estão no camarim ao lado.”

Eles se deram tão bem que o Queen convidou Lambert para se juntar a eles em um show de 15 minutos no MTV Europe Music Awards, em 2011. “Eu cometi o erro de ler alguns comentários online depois, e nossa, alguns fãs do Queen foram bem cruéis. Eu pensei, não posso me prender a isso”. Quando foi proposto que eles se juntassem para alguns shows em 2012, ele disse “Eu sabia que seria uma subida íngreme toda noite, um grande desafio pessoal e profissional”. Eles fizeram seis shows na Rússia e no Reino Unido. “Eu estava nas nuvens, era assim que estava me sentindo”.

Mas quando eles se reuniram novamente para a turnê americana no último ano, algo se encaixou. “Eu percebi que não adiantava me sentir intimidado porque nós estávamos nessa juntos. Eu tinha feito minha lição de casa. Eu li toda a biografia, assisti todos os documentários, escutei todos os álbuns. É como se essas músicas fizessem parte do meu sangue agora. Eu não precisava pensar sobre elas, apenas fazer. Você deixa seu instinto assumir e é quando as coisas se tornam interessantes.”

Lambert possui grande alcance vocal e controle. “Ele é um cantor muito ousado” segundo May, “Ele atinge notas que nem parece que podem ser alcançadas”. Apesar disso, ele não é tão conhecido no Reino Unido. O American Idol fez dele um nome familiar nos Estados Unidos, onde ele tem dois álbuns de sucesso, ainda que não tenha alcançado o sucesso em sua carreira que corresponde ao seu talento. “Eu não acho que a música pop é sobre quão alto você consegue cantar” diz Lambert. “Eu tenho aprendido bastante nesses últimos cinco anos. Não é sobre sua técnica. É sobre: Você é legal? Você é simpático? Você é interessante? Existe algo em você que prende as pessoas? E, oh, você consegue cantar? Que bom.”

Charmoso, falante, bem-humorado. Lambert se comporta de forma natural, vestindo sua sexualidade facilmente. “Veja, eu estou fora do armário desde os 18 anos e eu não estou voltando pra lá”, ele me assegurou.

Ele foi criado em San Diego em um ambiente criativo e liberal, sempre cercado de muita música. Aos nove anos Lambert se envolveu com o teatro, foi quando se tornou evidente que cantar era sua força, ele teve lições de canto e estudou ópera. A partir dos 19 anos, ele estava fazendo uma carreira no teatro musical, se apresentando em produções como Hair, Brigadoon e Wicked. “Eu comecei a gostar menos da ideia de estar no palco oito vezes por semana fazendo a mesma coisa, de novo e de novo. Eu queria mais espontaneidade, impulsividade, mas os shows da Broadway estavam se tornando cada vez mais um negócio, algo rígido”.

Em Los Angeles, durante seus 20 anos, Lambert conhecia pequenas bandas indie com inclinação glam rock. “Bowie e Queen foi onde eu me aprofundei. A maneira como eles se apresentavam, a teatralidade, a androgenia, o exagero. Quando eu estava chegando havia várias garotas estrelas do pop explorando aquilo, mas quando eu fiz isso, meu delineador parecia deixar as pessoas desconfortáveis, vai entender.”

Lambert fez sua audição para o American Idol, quase como uma última jogada de dados. “Eu já tinha 27 anos, eu sabia que o tempo estava passando e eu era abertamente gay. Eu pensei que o pior que podia acontecer era eu ganhar alguma notoriedade e dar uma alavancada na minha carreira no teatro”.

Lambert terminou como vice-campeão, perdendo para Kris Allen. “Essa exposição era o que eu precisava, um lugar em que um produtor executivo poderia olhar pra mim e pensar, ok, ele é alguém com quem podemos trabalhar.”

O que não se pode determinar ao certo é quanto o fato dele ser homossexual teria afetado sua carreira. Antes da final do American Idol fotos dele beijando outro homem se tornaram manchete. Mais tarde, no mesmo ano, quando Adam beijou seu baixista durante uma performance em uma premiação a emissora ABC recebeu muitas reclamações e cancelou sua participação no Good Morning America.

Lambert foi o primeiro artista abertamente gay a ter um álbum ocupando a primeira posição na lista da Billboard (“Trespassing” em 2012), mesmo com a presença de várias figuras pop como Liberace, Johnny Mathis, Elton John, Boy George, George Michael e, de fato, Mercury.

“Freddie se vestia com muito couro em uma banda chamada Queen” observa Lambert. “Era como se as pessoas não quisessem ouvir e elas, com certeza, não falavam sobre isso. Hoje, nos Estados Unidos, a mídia é obcecada com o gay. Minha sexualidade precede tudo que eu faço. Não é fácil passar por isso. Você quer ser aberto e fazer sua comunidade orgulhosa, mas ao mesmo tempo não quer se indispor com todos os outros”.

No entanto, se Lambert ainda não se tornou o superstar que muitos previram, pode ser também por causa de sua marca artificial de glam-pop que não é individual ou com personalidade suficiente para realmente dominar o mundo.

Sua colaboração com o Queen tem dado a ele uma plataforma global e será interessante ver como executar esse extenso catálogo noite após noite moldará seu próximo álbum. “Queen não é como a música pop atual, é uma emoção atemporal e universal e é por isso que suas músicas perduram. Eles entraram em quase todos os gêneros. Nós estamos fazendo canções de rock e blues, é como um show de variedades, é um grande desafio para um cantor.”

Bandas de rock parecem não desaparecer mais. Contanto que tenha pelo menos um membro ainda vivo (e às vezes nem isso) eles encontram formas criativas de manterem o show na estrada, com telas de vídeos, hologramas ou um substituto. Entre 2004 e 2009 Queen teve a colaboração da estrela do rock e soul Paul Rodgers. Esse último empreendimento está mais próximo do espírito impetuoso da banda em seus dias de glória. May se diz muito satisfeito com Lambert ser capaz de cantar todas as músicas em seu tom original, acrescentando que “era difícil até mesmo para Freddie”.

“Eu tive um pouco de dificuldade com ‘Don’t Stop me Now’”, admitiu Adam. “Os caras disseram, Hey, tudo bem, você não tem que fazer exatamente como o original. Freddie costumava diminuir um pouco o tom para encontrar uma maneira de fazer algumas partes mais fáceis pra ele mesmo. Mas Freddie podia fazer o que ele quisesse porque era sua música. Eu tenho um padrão diferente de expectativas. Eu tenho que fazer as grandes notas se não vão dizer que eu não dou conta”.

Não há planos que o Queen e Adam Lambert gravem juntos. Até o momento, é puramente, uma experiência ao vivo. “Quando Freddie morreu, nós assumimos que era só isso” admitiu Taylor. “Mas novos desafios surgiram e talvez, você pensa, ainda há mais vida”. O baixista original do Queen, John Deacon, deixou a banda (e a carreira na música) após a conclusão do álbum póstumo “Made In Heaven” em 1995. “É escolha de todos se aposentar” observa Taylor. “Mas desistir da vida a esse ponto, eu estava incomodado, tenho trabalhado com isso por tantos anos, é quem eu sou”.

“Nós não queríamos ser apenas uma banda de tributo”, disse May. “Nós construímos o Queen, nós vivemos e respiramos isso, era parte de nós. Nós ainda sentíamos que Freddie estaria conosco porque sua música, sua personalidade, sempre estaria conosco no palco”.

“Ele faz parte do nosso papel de parede mental, o que pode ser um pouco amargo”, diz Taylor. “Eu acho que levei cinco anos para me acostumar com o fato de que ele tinha ido embora. Mas o fato é que ele não está aqui, mas nós estamos o celebrando e o saudando e não é piegas em nada. Eu acho que ele teria aprovado. E eu sei que ele teria gostado do Adam.”

“Freddie e Adam tinham atitudes semelhantes quanto à vida”, concorda May “um senso de humor, trejeitos e leveza. Queen tem um lado sério, mas um pouco de humor é o que mantém todos sãos”.

“Cantando suas músicas todas as noites, eu me sinto mais próximo de Freddie”, diz Lambert. “Eu gostaria de ter o seu tom mais pesado. Ele fumava como uma chaminé e tinha aquela voz forte. A maneira como ele atacava as notas, era incrível, sexy, poderoso. Eu sou um fã, e essa é minha conexão com o público. Eu me sinto sortudo por estar lá. Quer dizer, esse não era o grande Queen? Bem, eles ainda são”.

Autoria do Post: Elisa Ferrari
Tradução: Gisele Duarte
Fonte: The Telegraph

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